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Defender o Código Ambiental Catarinense é defender o bom senso, a agricultura e a autonomia dos estados

Por José Milton Scheffer

 

Santa Catarina está no centro de uma disputa jurídica e política que vai muito além de mapas, artigos de lei ou resoluções técnicas. A contestação do Código Ambiental Catarinense pelo Ministério Público Federal, hoje em análise no Supremo Tribunal Federal (STF), coloca em xeque o direito constitucional dos estados legislarem com base em suas realidades sociais, geográficas e econômicas. A decisão, que pode parecer técnica, na verdade ameaça diretamente o modo de vida de milhares de famílias rurais, a força do setor agroflorestal e o equilíbrio federativo brasileiro.

O cerne da controvérsia está na definição dos chamados “Campos de Altitude”. O órgão de fiscalização ambiental federal entende que deve ser aplicado o conceito da Lei Federal da Mata Atlântica, que se baseia em um mapa do IBGE. Esse mapa considera como campos de altitude todas as áreas acima de 400 metros, já o Código Ambiental Catarinense adota outro critério: define como campos de altitude apenas as áreas acima de 1.500 metros. Essa definição está baseada na realidade local e foi construída com base em debates com a sociedade, órgãos públicos e instituições acadêmicas. A razão é simples: se for adotado o critério federal, 76% do território catarinense (o que representa cerca de 268 dos 295 municípios) estariam, automaticamente, em situação de desconformidade legal. Essa divergência, longe de ser meramente acadêmica, representa a diferença entre o desenvolvimento sustentável e a paralisia socioeconômica.

Santa Catarina é exemplo nacional em produtividade, mesmo representando apenas 1,1% do território brasileiro. O estado responde por 35% do plantio de pinus no país e 40% da produção nacional de celulose de fibra longa. Na agricultura e pecuária, é referência em eficiência e tecnologia. Ignorar essa dinâmica em nome de uma interpretação ampla e descontextualizada da legislação ambiental é desconsiderar o Brasil real: aquele que vive e produz nas pequenas propriedades, que combina conservação e produção, que depende do uso racional da terra para sobreviver.

Segundo a análise de impacto realizada por economistas da Tendências Consultoria, caso prevaleça o entendimento de que todas as áreas entre 400 e 1.500 metros estejam sob regime integral de preservação, Santa Catarina poderá perder R$ 10,6 bilhões em PIB, mais de R$ 1,8 bilhão em salários e 197 mil postos de trabalho. É uma tragédia social anunciada, sobretudo para os pequenos produtores, base da economia rural catarinense, onde 86% das propriedades têm até 50 hectares.

O Código Ambiental de Santa Catarina foi elaborado com base técnica, ampla participação social e com respaldo do Legislativo estadual. Ele respeita o meio ambiente, mas também respeita quem vive dele. E o faz com equilíbrio. Estudos como o realizado na região da Coxilha Rica demonstram que há, sim, espaço para a conservação aliada ao uso produtivo da terra, com rotatividade de culturas, recuperação de áreas e gestão consciente dos recursos.

Além disso, dados do MapBiomas apontam que a área de floresta no estado cresceu entre 2008 e 2018, mesmo com a atividade agropecuária em expansão. Isso prova que a lógica de destruição ambiental não se sustenta quando se analisa a realidade catarinense com honestidade.

Há também uma questão constitucional: estados têm competência para legislar concorrentemente sobre meio ambiente, especialmente quando se trata de adaptar diretrizes gerais à realidade local. Substituir a lei estadual seria uma ruptura do pacto federativo, uma negação da autonomia dos estados e do papel dos parlamentos estaduais.

Defender o Código Ambiental Catarinense não é defender um setor, um partido ou uma ideologia. É defender a racionalidade técnica, o equilíbrio institucional e o direito das famílias que cuidam da terra com responsabilidade. É garantir que Santa Catarina continue sendo referência em produção sustentável. É preservar o futuro da natureza, da economia e das pessoas.