A comunicação política transformou-se profundamente ao longo dos tempos — como seria de se esperar. Jornais impressos, telégrafo, fax, mimeógrafo, máquina de escrever, computador, smartphones: o debate político acompanha as transformações sociais e os novos canais de comunicação.
No campo filosófico, abre-se espaço para refletir sobre os juízos de valor envolvidos nessas mudanças. Já sob a perspectiva sociológica, é incontornável reconhecer o impacto desses novos arranjos na organização da vida social e política.
Chamo atenção, dentro desse processo, para as passagens da cultura livresca para a cultura televisiva e, desta, para a cultura mass media, em que, analogicamente, o eleitor se transforma de leitor em telespectador e, em seguida, de telespectador em internauta interativo. Essa passagem não constitui uma conclusão pessoal do autor, mas é inspirada na análise feita por Jürgen Habermas sobre a crise da cultura livresca e a transformação da esfera pública na obra Mudança Estrutural da Esfera Pública (Strukturwandel der Öffentlichkeit).
Sirvo-me desse embasamento teórico para revisitar alguns momentos da história política de Santa Catarina em que essas transformações se tornavam visíveis. Quando o eleitor era leitor, os grandes debates aconteciam em artigos publicados em periódicos como O Catharinense, O Correio do Brasil, O Correio Oficial de Santa Catarina, O Commercio, O Estado e A Notícia. Nesses veículos, republicanos, pessedistas, arenistas e udenistas defendiam suas ideias e respondiam-se mutuamente com textos repletos de estilos literários, simbolismos e um português rebuscado, que impactava os leitores, que viam seus representantes como homens intelectuais, inteligentes e capazes. É desse período o predomínio de líderes cuja força política estava associada à cultura livresca, como Hercílio Luz, Lauro Severiano Müller, Nereu Ramos e mais tarde, Jorge Borhausen, reconhecidos pela formação erudita e pela centralidade da escrita na prática política.
Anos mais tarde, com a popularização da televisão e a sociedade ganhando contornos de — plim-plim — o eleitor transforma-se em telespectador. Inicia-se a era dos grandes marqueteiros: os programas políticos televisivos passam a ser planejados para emocionar, e cada minuto é disputado pelas coligações. No final da década de 1990 e nos anos 2000, os debates televisivos eram os momentos mais aguardados. É impossível não recordar os confrontos entre o PPB (atual PP) e o PMDB (atual MDB): de um lado, a capacidade de comunicação e o pensamento rápido e astuto de Esperidião Amin — o homem do “livro denso e difícil”, do BID, do Microbacias e do programa Troca-Troca — traduzido para a narrativa televisiva; de outro, a tranquilidade e o raciocínio contido, algumas vezes disperso, de Luiz Henrique da Silveira, o homem do sintético e do extremamente resumido “Plano 15”. Tratava-se de um embate entre o “centralizador” e o “descentralizador”, no qual o eleitor-telespectador vibrava diante da TV, muitas vezes comendo pipoca.
E agora, na sociedade hodierna, surge o eleitor internauta: aquele que interage com a nova geração de políticos participando de lives, usando emojis, comentando, curtindo, compartilhando — atuando, enfim, como parte ativa da comunicação política digital. Trata-se de um eleitor que parece não se preocupar com o conteúdo literário e com a linguagem rebuscada dos líderes da era dos livros, nem mesmo com as retóricas elaboradas, cheias de silogismos, muitas vezes desconcertantes dos líderes televisivos. Contudo, percebe-se que, para além do espectro ideológico, o que move o eleitor internauta e interativo é o entretenimento, o espetáculo, o cômico, a polêmica, a “treta”. E, se tudo isso convergir para o engajamento — calibrando bem o tráfego e ampliando o alcance — então está valendo! Os showmícios da modernidade não são os mesmos do passado.
À filosofia política cabe o juízo de valor; à sociologia, a constatação de que as coisas mudam. Entre os marketeiros digitais, porém, difunde-se o presente mantra: goste-se ou não, quem não muda, é mudado.
Vilmar Dal Bó
Doutor em Ciências Econômicas e Políticas, pelo Instituto Universitário Sophia, Florença, Itália.






