Blog do Prisco
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A cultura alemã e a perseguição ideológica

 

Durante os quatro anos (2019-2022) de Jair Bolsonaro (PL) na Presidência da República, mudanças nos decretos que regulamentavam a Lei Rouanet praticamente inviabilizaram o financiamento de atividades culturais no país, segundo artistas e promotores do setor. Na troca para a nova gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a situação aparentemente voltou à normalidade. O chamado trade cultural abaixou suas armas e aparenta estar contemplado.

Em Santa Catarina, um Estado com forte tradição da imigração europeia (portuguesa,italiana e alemã especialmente) é natural que suas manifestações culturais, das mais diversas, sejam valorizadas, incentivadas e recebam apoio financeiro tanto da iniciativa privada como do poder público. A Oktoberfest de Blumenau, por exemplo, surgiu em 1984 para valorizar a cultura germânica, atrair turistas para a cidade e também recuperar a autoestima do blumenauense, que havia sofrido grande impacto de enchentes ocorridas durante o ano anterior. Hoje a festa é referência em todo o país e atrai milhares de turistas anualmente para o Vale do Itajaí.

As emendas parlamentares impositivas em SC passaram a ser pagas de fato
em 2019, seguindo um modelo que já funcionava a todo vapor em âmbito federal. Ela permite que cada deputado estadual aponte no orçamento do executivo valores para as mais diversas áreas. Quando um parlamentar destina um determinado recurso para um clube de caça e tiro e o governo define que a tramitação burocrática ocorra pela rubrica da Fundação Catarinense de Cultura (FCC), não significa que a pasta esteja perdendo recursos. Há, tão somente, um cumprimento legal por parte do executivo ao pagar um valor indicado por um parlamentar.

Assim como a língua, as músicas típicas, as festas, os clubes de caça e tiro são inegavelmente traços da herança cultural que Santa Catarina herdou dos imigrantes alemães, assim como outras culturas também deixaram suas marcas, sua impressão digital na formação da sociedade catarinense. Durante o período do Estado Novo, ditadura implantada por Getúlio Vargas a partir de 1937, os imigrantes, especialmente os alemães e os italianos, sofreram perseguição da polícia política e eram impedidos, inclusive, de falar sua língua natal em público. Foram taxados como conspiradores nazistas e fascistas durante a Segunda Guerra Mundial. Do dia para noite precisavam esquecer sua língua e cultura e se tornarem “brasileiros” de verdade.

Antes de mais nada, quem defende mais recursos para cultura não pode querer determinar qual origem étnica merece ou não recursos públicos. Os clubes de caça e tiro são legítimos merecedores de investimentos, assim como qualquer manifestação da cultura de outros povos e que cumpram os regramentos legais para recebimento de emenda parlamentar.

*Por Rubens Cardiga – jornalista e assessor parlamentar*