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A LEI ROUANET E O CASAMENTO DA BUDISTA COM O CRISTÃO

Os episódios midiáticos sobre a lei Rouanet que tomaram a mídia nos últimos dias ofertam sempre o risco de se afundar uma ótima iniciativa, no momento que se joga na vala comum milhares de bons projetos culturais, tocadas por milhares de profissionais sérios da cultura que trabalham de forma incessante para divulgar seu trabalho.

A lei é boa, precisa ser aperfeiçoada, pois a sociedade evolui e junto com ela a necessidade primária de dar mais transparência as verbas oriundas da renúncia fiscal.

Criada em 1991, durante o Governo Fernando Collor, para que o Estado assumisse sua missão intrínseca de fomentar a cultura brasileira, e que na época, buscava salvar alguns seguimentos, como o de produção de filmes. Após 25 anos de sua criação, a avaliação é que ela e outras que seguem o seu modelo, como a Lei do Audiovisual (à qual aplicam os longas-metragens), cumpriram a sua tarefa: só em 2015, quase 6.000 projetos foram aprovados nos moldes da Rouanet e financiados com dinheiro de isenção fiscal (quase 4 bilhões de reais no mesmo ano). O Brasil engatou numa crescente cultural, a oferta na área disparou e a lei que nasceu a partir de estudos sobre outras leis nacionais de incentivo, como a francesa, se tornou o principal financiador da cultura do país. Os produtos brasileiros de cultura, notadamente o cinema nacional, e mais recentemente as animações, vem a passos largos ganhando espaço no cenário mundial, e ninguém pode deixar de notar a importância desse segmento para a economia, mas antes precisamos também aclarar alguns pontos:

O que é?

A lei estabelece que pessoas jurídicas e físicas podem doar parte de seu imposto de renda para apoiar projetos culturais (4% no caso das jurídicas, 6% no das físicas). A lei não permite, além do incentivo fiscal, recursos diretos do Governo federal. Nota-se a primeira confusão, a norma regula a renúncia fiscal, limitando ainda às empresas que apuram sobre lucro real, o que é lamentável, pois milhares de empresas que poderiam apoiar projetos ficam proibidas de fazê-lo, nos termos dessa Lei.

Como funciona?

Aos moldes da francesa, ela é uma lei de mecenato, ou seja. Alguém ou alguma empresa com uma ideia de um projeto cultural pode formatá-lo em certos moldes específicos, com as informações devidas, e protocolá-lo em um sistema para que ele seja analisado por especialistas do Ministério da Cultura. Após analisado, admitido e aprovado, o projeto ganha um selo da Lei Rouanet e assim poderá ser apresentado a empresas ou pessoas interessadas em apoiá-lo doando parte de seu imposto. O dinheiro é do Estado, porque representa uma renúncia fiscal, mas quem decide seu destino é quem paga o tributo, logo o mecenas.

Pontos críticos

Uma das maiores críticas, feitas à lei Rouanet reside no fato de que ela dá poder a uma empresa ou a uma pessoa que não necessariamente detém conhecimentos sobre arte e cultura (e também sobre a importância cultural ou artística de determinado projeto para a sociedade) de escolher o que apoiar.

Logo são sempre escolhidos os projetos de maior visibilidade, e que tenham no seu elenco, nomes de maior relevo midiático.

É de se destacar que o projeto pode e deve dar lucro, pois o lucro não está proibido.

Os objetivos estão claros na Lei:

Art. 1° Fica instituído o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), com a finalidade de captar e canalizar recursos para o setor de modo a:

I – contribuir para facilitar, a todos, os meios para o livre acesso às fontes da cultura e o pleno exercício dos direitos culturais;

II – promover e estimular a regionalização da produção cultural e artística brasileira, com valorização de recursos humanos e conteúdos locais;

III – apoiar, valorizar e difundir o conjunto das manifestações culturais e seus respectivos criadores;

IV – proteger as expressões culturais dos grupos formadores da sociedade brasileira e responsáveis pelo pluralismo da cultura nacional;

V – salvaguardar a sobrevivência e o florescimento dos modos de criar, fazer e viver da sociedade brasileira;

VI – preservar os bens materiais e imateriais do patrimônio cultural e histórico brasileiro;

VII – desenvolver a consciência internacional e o respeito aos valores culturais de outros povos ou nações;

VIII – estimular a produção e difusão de bens culturais de valor universal, formadores e informadores de conhecimento, cultura e memória;

IX – priorizar o produto cultural originário do País.

São essas as políticas que devem ser atendidas, e a legislação também faz previsão a forma de emprego do valor arrecadado:

Art. 3° Para cumprimento das finalidades expressas no art. 1° desta lei, os projetos culturais em cujo favor serão captados e canalizados os recursos do Pronac atenderão, pelo menos, um dos seguintes objetivos:

I – incentivo à formação artística e cultural, mediante:

a) concessão de bolsas de estudo, pesquisa e trabalho, no Brasil ou no exterior, a autores, artistas e técnicos brasileiros ou estrangeiros residentes no Brasil;

b) concessão de prêmios a criadores, autores, artistas, técnicos e suas obras, filmes, espetáculos musicais e de artes cênicas em concursos e festivais realizados no Brasil;

c) instalação e manutenção de cursos de caráter cultural ou artístico, destinados à formação, especialização e aperfeiçoamento de pessoal da área da cultura, em estabelecimentos de ensino sem fins lucrativos;

II – fomento à produção cultural e artística, mediante:

a)produção de discos, vídeos, obras cinematográficas de curta e média metragem e filmes documentais, preservação do acervo cinematográfico bem assim de outras obras de reprodução videofonográfica de caráter cultural; 

b) edição de obras relativas às ciências humanas, às letras e às artes;

c) realização de exposições, festivais de arte, espetáculos de artes cênicas, de música e de folclore;

d) cobertura de despesas com transporte e seguro de objetos de valor cultural destinados a exposições públicas no País e no exterior;

e) realização de exposições, festivais de arte e espetáculos de artes cênicas ou congêneres;

III – preservação e difusão do patrimônio artístico, cultural e histórico, mediante:

a) construção, formação, organização, manutenção, ampliação e equipamento de museus, bibliotecas, arquivos e outras organizações culturais, bem como de suas coleções e acervos;

b) conservação e restauração de prédios, monumentos, logradouros, sítios e demais espaços, inclusive naturais, tombados pelos Poderes Públicos;

c) restauração de obras de artes e bens móveis e imóveis de reconhecido valor cultural;

d) proteção do folclore, do artesanato e das tradições populares nacionais;

IV – estímulo ao conhecimento dos bens e valores culturais, mediante:

a) distribuição gratuita e pública de ingressos para espetáculos culturais e artísticos;

b) levantamentos, estudos e pesquisas na área da cultura e da arte e de seus vários segmentos;

c) fornecimento de recursos para o FNC e para fundações culturais com fins específicos ou para museus, bibliotecas, arquivos ou outras entidades de caráter cultural;

V – apoio a outras atividades culturais e artísticas, mediante:

a) realização de missões culturais no país e no exterior, inclusive através do fornecimento de passagens;

b) contratação de serviços para elaboração de projetos culturais;

Com conceitos tão genéricos quase tudo pode ser apoiado, inclusive o casamento do meu amigo Carlos de Oliveira, um cristão de carteirinha com a sua futura Esposa Lucia Wang, chinesa, porém residente no Brasil, e budista por opção.

Afinal diante do exposto quem se atreve a questionar o encontro de duas culturas tão distintas e diferentes, entre dois povos que certamente irão estimular a integração nacional e divulgar os hábitos da família cristã e budista.

Quanto aos convidados, todos receberão um CD, com o filme do enlace, devidamente patrocinado, afinal tal produção gera empregos na cultura local e serve para difundir os valores culturais.

Se não tiver transparência, e critérios mais técnicos nessa Lei tudo pode, até o casamento.

 

Charles M. Machado

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