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Livro abordará Operação Faroeste, grilagem e corrupção de juízes na questão fundiária

O Defensor Público, Ralf Guimarães Zimmer Junior, estará lançando, no próximo mês de agosto (data a definir), no Congresso Nacional, seu novo livro, no qualaborda a questão fundiária no Brasil e a necessidade de abertura de CPI em relação aos desdobramentos Operação Faroeste, da Polícia Federal, que investiga a grilagem de terras e a corrupção de juízes. Especialmente no Estado da Bahia, mas com ramificações em outras unidades federadas.
A obra foi prefaciada pelo jurista Pericles Prade, que é ex-juiz Federal. Prade foi advogado de Zimmer, ao lado de Leandro Maciel, na abertura do primeiro pedido de impeachment contra o então governador Carlos Moises (primeiro procedimento deste quilate a afastar cautelarmente um governador do Estado no Brasil desde 1950).
O autor deu uma palhinha à coluna, que segue abaixo (Capa, Sumário e prefácio do livro). Vale a leitura!

“VISÃO CRÍTICA: ABORDAGEM JURÍDICA E SOCIAL
Péricles Prade (*)

A Polícia Federal, em 2019, utilizando forçada metáfora cinéfila,
instaurou a denominada Operação Faroeste para apurar a existência de fraudes
processuais, na Bahia, praticadas por juízes de primeira instância e
desembargadores, em coautoria com advogados antiéticos e servidores também
corrompidos, no espúrio interesse de grileiros inescrupulosos, de robusto poder
econômico, detentores rapinantes de vasta região de terras (360 mil hectares), cuja
posse foi esbulhada dos verdadeiros e legítimos proprietários, pessoas simples e
desprovidas de recursos de todo gênero.
Metáfora anêmica que, nada obstante a falta de originalidade,
serviu de estímulo à denúncia dos criminosos pelo Ministério Público, a ponto de
ocasionar a prisão de alguns envolvidos, pondo à tona o rosto manchado dessa
quadrilha constituinte de típica organização criminosa.
As mencionadas fraudes correspondem a uma pletora de
decisões, mormente as ocorridas no âmbito do noticiado Tribunal de Justiça baiano,
geradas pelas frequentes propinas no curso dos anos, com desprezo de comezinhos
princípios jurídicos, convalidando inventários fabricados há décadas com falsos
(adulterados) documentos, tudo para dissimular a titularidade dos direitos reais.

Enfim, sob a deletéria incidência de podre titulação dos registros. E o mais grave é
que a atuação da grilagem não se resumiu à perpetração das graúdas fraudes,
formalizadas e materializadas pela compra e venda de sentenças e acórdãos, já que
a disputa das terras, simultaneamente, atraiu a cobiça de pistoleiros profissionais,
autores de vários assassinatos encomendados pelos poderosos da região.
Ainda que se saiba terem sido apenas poucos os magistrados
responsáveis pela cobertura desses delitos cíveis e criminais, o conhecido defensor
público Ralf Guimarães Zimmer Junior não silenciou, e resolveu, com evidente
espírito cívico, escrever um texto candente para, além de esvurmar os efeitos da
aplaudida Operação, oferecer pertinentes sugestões para desdobrá-la, a fim de que,
em definitivo, seja possível restituir aos únicos donos as terras arrebatadas à força
pelos marginais grileiros.

Sob o fluxo do seu desiderato maior, o ensaísta faz, no
transcurso das observações pontuais, uma espécie de J’accuse, à maneira de Émile
Zola, mediante crítica visão jurídica e social.
Do ponto de vista jurídico, permeia com familiaridade a Filosofia
do direito (princípios gerais do direito/ análise sistemática do ordenamento); o Direito
constitucional (dando ênfase ao princípio reitor da dignidade da pessoa humana / a
função transcendental da posse e da propriedade, inclusive a rural / a política agrária
e fundiária / a justa indenização derivada da desapropriação, necessidade de
arguição de descumprimento de preceito fundamental etc etc.); Direito civil (posse /
contrapondo as teorias de Savigny e Ihering / modos de aquisição de imóveis / a
usucapião / Registro torrens / evicção etc etc); o Código de Processo Civil
(efetividade do sistema de Justiça); o Direito penal e o processo penal (destaca a
urgência de responsabilização dos delinquentes bilionários piratas/ os efeitos no
juízo cível) e por aí vai, numa radiografia técnica para afastar as mazelas impeditivas
da realização da Justiça.

Quanto aos aspectos sociais, estão conjugados aos dos ditames
jurídicos, em virtude de sua natural imbricação. Avulta a função social da
propriedade, merecendo encômios, com destaque, a prévia abordagem histórica em
torno das capitanias hereditárias e da lei das sesmarias.
Essa situação, saliento, piorou na Primeira República (1889-
1930), e também neste Estado, com a desterritorialização dos desterrados
indígenas, caboclos (Guerra do Contestado), africanos e outros tipos de
trabalhadores despojados da propriedade/posse de suas terras. E tudo porque
sempre foi notável a maior preocupação do Sistema com a integridade do território,
em detrimento das gentes (população), favorecendo as elites econômicas.
Aventuras que continuaram, à margem da Lei, no Brasil, precipitadas pelo processo
de territorialização dos imigrantes, já seduzidos e enganados na Europa.

O criador desta obra, diante desse sintético quadro crítico,
poderia ficar satisfeito por ter fornecido ao leitor relevantes informações sobre o
escândalo ocorrente naquele maravilhoso Estado, limitando-se a revelar apenas os
pontos cruciais do vergonhoso episódio.
Todavia, não era e não é este o seu primordial objetivo.
Hospeda-se noutro sítio. Pretendeu e pretende contribuir para regularizar a questão
fundiária no país (a desordenada ocupação dos imóveis da União, inclusive), de
modo a possibilitar a correta distribuição de terra, sob pena de tornar letra morta o
seu Estatuto.

Para combater a deplorável e contínua grilagem, sustenta, como
resultado favorável da Operação Faroeste, a imediata abertura de uma Comissão
Parlamentar de Inquérito – CPI (mista), no Congresso, sem prejuízo daquela relativa
aos pleitos do movimento dos sem-terra (MST), quando legítimos, bem como
entende salutar que o Conselho Nacional de Justiça – CNJ institua um mutirão para
facultar a prolação de sentenças em ações reivindicatórias e anulatórias de títulos
translativos imobiliários, apurando-se, com tais providências, entre outras, as
infrações constantes e alijadoras de direitos consagrados pela nossa Constituição.
Por último, anoto que o autor deste livro se pautou com
propriedade analítica, numa perspectiva hermenêutica vinculada à racionalidade
jurídica contemporânea, numa linha aproximada de Chaïm Perelman (o direito
origina-se na prática, sob os parâmetros do fato e da lei). Racionalidade que se
submete, como afirma Robert Alexy, à argumentação que, a rigor, interessa também
a qualquer cidadão ativo na arena pública, como pertencente ao corpo do auditório
universal.

Recomendo sua leitura, na esperança de que esta vertical
dicção em especial frutifique perante o parlamento nacional, transformando em
realidade as ideias aqui expostas e justificadas com generosa percuciência,
amparada pelo signo da humana solidariedade.

(*) Da Academia paulista de Direito. Ex-juiz federal.
Ex-professor da PUC/SP, FMU, FURB e UNB. Advogado Constitucionalista”