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MPSC alerta para importância de falar sobre as pessoas idosas em situação de violência neste momento de pandemia

Na semana que marca o Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa (15/6), o MPSC fala dos casos de violência física, financeira e psicológica que acontecem dentro de casa.

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O enfrentamento à covid-19 confinou em casa o chamado grupo de risco, do qual o idoso faz parte – situação que acende o sinal de alerta para o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC). O “Balanço Geral de 2011 ao 1º semestre de 2019 – Pessoa Idosa” apontou que 80,72% das violações de direitos ocorrem na casa dos idosos e são cometidas por pessoas do seu convívio familiar. Por essa razão, o MP catarinense já atua na construção de um protocolo de atendimento as vítimas e, neste momento de pandemia, realiza campanha nos canais de comunicação institucionais com o intuito de esclarecer todos os tipos de violência aos quais o idoso está sujeito dentro de casa.

“É uma situação que nos exige redobrada atenção com relação a esse grupo de pessoas, que naturalmente já tem situações de violência acobertadas pela intimidade do lar. Com o isolamento social exigido para o enfrentamento da pandemia de covid-19, essas situações se agravam, e isso reforça a necessidade da disseminação da informação e, sobretudo, de participação da comunidade na proteção da pessoa idosa. A política pública tem trabalhado e buscado se adaptar a essa nova realidade para garantir a proteção da vida e da saúde da pessoa idosa”, explica o coordenador do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos e Terceiro Setor (CDH), Promotor de Justiça João Douglas Roberto Martins.

Neste dia 15 de junho, data instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) como Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa, o coordenador do CDH destaca, ainda, a importância de a sociedade entender todos os tipos de violência aos quais os idosos estão sujeitos. Apesar de o termo nos remeter imediatamente à violência física, outros tipos de violência, inclusive veladas, podem resultar em efeitos tão ou mais maléficos que a agressão física propriamente dita.

A negligência, por meio da ausência de amparo e responsabilização, ainda se apresenta como o tipo mais comum de violência praticada contra os idosos em Santa Catarina, seguido da violência psicológica, mais especificamente a hostilização, e da violência patrimonial por meio da retenção de salário e bens.

“A violência contra as pessoas idosas está profundamente entrelaçada a estruturas sociais, econômicas, políticas e educacionais que perpetuam práticas sistemáticas de violência e desrespeito aos direitos humanos. Identificar quando a violência acontece, seja ela psicológica, física ou financeira, é uma missão dos órgãos e profissionais da saúde que atuam no tema, mas sobretudo de cada cidadão”, detalha Martins.

Tipos de violência contra o idoso

O Estatuto do Idoso considera como violência contra a pessoa idosa qualquer ação ou omissão praticada em local público ou privado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico (art. 19, § 1º). Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), o abuso de idoso é “um ato único ou repetido, ou a falta de ação adequada, que ocorre em qualquer relacionamento em que existe uma expectativa de confiança e que cause danos ou sofrimento a uma pessoa idosa. Inclui abusos físicos, sexuais, psicológicos, emocionais, financeiros e materiais; abandono; negligência e ações que comprometem a dignidade e o respeito”.

A violência física, definida também como abuso físico, caracteriza-se por atos e condutas que acarretem dano à integridade física da pessoa idosa, causando-lhe dor ou ferimentos. São exemplos comuns de violência física contra a pessoa idosa tapas, socos, chutes, beliscões, mordidas e arranhões.

A violência psicológica pode ser a forma mais velada de violência contra as pessoas idosas. Caracteriza-se por todas as formas de desrespeito, preconceito, discriminação, depreciação, rejeição e intimidação a esse grupo. A violência psicológica pode ocorrer por meio da fala do seu agressor, seja na conversa aparentemente cordial ou na forma de gritos, piadinhas ou, ainda, qualquer atitude com um viés violento e assimétrico sobre a pessoa idosa.

Há também a violência da negligência e do abandono. Envolve a falha no atendimento de necessidades básicas, tais como alimentação, habitação, higiene, vestimentas e cuidados de saúde. Manifesta-se, frequentemente, associada a outros abusos que geram lesões e traumas físicos, emocionais e sociais, em particular para as pessoas que se encontram em situação de múltipla dependência ou incapacidade.

A violência sexual pode ocorrer no próprio relacionamento conjugal ou ser praticada por outros indivíduos (como cuidadores e outras pessoas com as quais o indivíduo convive socialmente), que, aproveitando-se da situação de fragilidade da pessoa idosa, se utilizam de força física, manipulação psicológica ou substâncias psicoativas para submetê-la à prática de atos sexuais ou libidinosos sem o seu consentimento .

Na violência financeira, segundo tipo de violência mais comum contra a pessoa idosa, há o uso ilegal ou não consentido de recursos financeiros e patrimoniais. A prática pode se caracterizar por meio da outorga de procuração com amplo acesso aos bens patrimoniais, da venda de bens e imóveis sem consentimento, do confinamento em ambientes mínimos dentro de suas próprias residências, da subtração e da privação do acesso a recursos econômicos, da destruição parcial ou total de instrumentos de trabalho, da ocultação de documentos pessoais e de dinheiro. Da mesma forma, o assédio na oferta de empréstimo consignado a pessoas idosas pelas instituições bancárias pode se caracterizar como um exemplo de violência financeira cometida contra idosos.

ALGUNS SINAIS INDICATIVOS DE VIOLÊNCIA CONTRA IDOSOS:

– lesões em regiões escondidas por roupas;

– queimaduras com cigarros, cortes, lacerações e feridas infectadas;

– fraturas inexplicáveis;

– idosos que desenvolvem quadros associados à depressão e à ansiedade, podendo evoluir para doenças físicas e psicossomáticas;

– higiene precária;

– vestuário inapropriado ao clima/ambiente; 

– retenção de cartões magnéticos de conta bancária ou de benefícios previdenciários de sua titularidade, sacando os valores existentes sem revertê-los ou revertendo-os apenas parcialmente em benefício do idoso, negligenciando os cuidados necessários e não provendo suas necessidades básicas, inclusive alimentos. 

MPSC na garantia dos direitos do idoso

Para garantir os direitos dos idosos, o MP catarinense atua tanto individualmente, resguardando o idoso que foi vítima de violência, quanto na área coletiva, fomentando a implementação de políticas públicas na área. A partir de reuniões promovidas pelo Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos e Terceiro Setor com outros órgãos, como o Conselho Estadual do Idoso, as Polícias Civil e Militar, o Tribunal de Justiça e as Secretarias de Estado da Assistência Social, Trabalho e Habitação e da Saúde, no próximo mês será lançado o protocolo de atendimento de casos de violência contra o idoso em Santa Catarina.

Com base em um diagnóstico junto aos municípios catarinenses sobre os fluxos de atuação no enfrentamento a essa violência, será apresentado um protocolo adaptável às diferentes realidades do idoso. O objetivo é tornar a rede de proteção mais eficiente na prevenção dessas violências e na responsabilização do agressor.

Por meio do CDH, o MPSC desenvolve, ainda, o programa “Acompanhamento das instituições de longa permanência para idosos em Santa Catarina”, lançado em 2000, que já mapeou 237 instituições no estado, averiguando a qualidade dos serviços prestados e as condições desses locais, que são fundamentais para o cuidado e a assistência básica ao idoso. O programa é uma parceria do MPSC com o Conselho Estadual e Conselhos Municipais do Idoso, o Corpo de Bombeiros Militar, a Vigilância Sanitária e o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Santa Catarina (CREA).

Outra iniciativa é o programa “Estímulo à criação e efetiva atuação dos Conselhos Municipais do Idoso”, que fomenta a criação e o funcionamento dessas entidades, que auxiliam na formulação e no acompanhamento da política de atendimento ao idoso nos municípios. Em 2016, após dois anos de programa, constatou-se um incremento de cerca de 300% no número de conselhos ativos no estado.

Todos os cidadãos um dia serão idosos

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Mesmo com todo esse trabalho, o MP catarinense sabe da importância fundamental da sociedade. “É com o despertar da consciência de que todas as pessoas são responsáveis e podem transformar essa realidade de violência contra idosos a partir do seu agir que mudaremos esta realidade”, ressalta Martins. Algumas reflexões, como fazer perguntas a si mesmo, podem ajudar a se colocar no lugar dos outros, como: “O que eu penso e sinto em relação à violência contra idosos? E se fosse comigo?”

Há uma previsão na Constituição Federal de que a sociedade em geral é corresponsável, junto com o poder público, pelos grupos vulneráveis. Essa corresponsabilidade faz com que seja obrigação de qualquer cidadão que conheça ou desconfie de uma situação de violência vivenciada por uma pessoa idosa reportar o caso às autoridades, para que as instituições públicas possam agir e fazer a proteção da pessoa idosa.

A nossa sociedade em geral ainda tem uma visão bastante negativa a respeito da pessoa idosa. Considerar a velhice como fase de decadência é um tipo de violência. É preciso o desenvolvimento de uma consciência de respeito aos direitos de todos os seres humanos em todos os seus ciclos de vida, a não complacência com qualquer tipo de comportamento de violência contra o idoso ou qualquer grupo vulnerável”, finaliza Martins.