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“O réu não pode escolher o juiz”

A Comissão Especial do Projeto de Lei 4850/16, que discute as dez medidas de combate à corrupção propostas pelo Ministério Público Federal (MPF) – da qual o deputado federal Celso Maldaner (PMDB-SC) é membro titular – está promovendo uma série de audiências públicas, em Brasília, para promover o amplo debate do tema e tentar formar um texto de consenso sobre o assunto. Nesta terça-feira (23), a comissão ouviu Alberto Carlos de Almeida, Doutor em Ciências Sociais; Heleno Torres, Professor Titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP); Marcelo Semer, Juiz de Direito do Estado de São Paulo; e Gamil Föppel, Advogado e Professor de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Durante a reunião, o deputado Celso Maldaner destacou a importância da pluralidade de pontos de vista para enriquecer o debate. “Acredito que a questão do sistema eleitoral é a origem de tudo: falta transparência no fundo partidário, por exemplo. Outra questão é a indicação de cargos no governo: qual o interesse por trás da indicação de uma diretoria? É ético? Isso me preocupa e acho que devemos discutir seriamente”, expressou.

Foro Privilegiado

Por fim, Maldaner indagou a opinião dos convidados sobre o foro privilegiado. “Hoje, estima-se que hajam no País mais de 35 mil pessoas que possuem o privilégio, que, para mim, é sinônimo de impunidade. Colhi as assinaturas e apresentei a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 247, que extingue esta distorção jurídica para todos os cargos”, expressou o deputado.

Celso Maldaner juiz
Em resposta, o Juiz de Direito do Estado de São Paulo, Marcelo Semer, expressou que concorda integralmente com o fim desta prática. Para ele – opinião endossada por Maldaner – democracia significa todos terem os mesmos direitos e serem sujeitos aos mesmos juízes. O problema, expressou, é que o tema só é debatido quando há em vista algum julgamento. Na opinião do juiz, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi desidratando o foro privilegiado, em dado momento, por meio da tomada de diferentes decisões acerca do desmembramento de processos. “Enquanto houver foro privilegiado, sempre vai haver a possibilidade – que eu acho que é nefasta, em todas as circunstâncias, de todos os partidos – de o réu poder escolher o juiz. O réu não pode escolher o juiz”, encerrou Marcelo.

Impunidade 

Para Maldaner, o foro configura uma afronta ao princípio ético de igualdade entre os cidadãos perante a Lei e é hoje sinônimo de impunidade. “Penso que, no combate à corrupção, o primeiro passo é acabar com esta distorção jurídica que concede privilégios de julgamento a figuras políticas. Por isso, apresentei esta PEC para acabar com este equívoco, garantindo a igualdade de julgamento a todos os brasileiros, independentemente do cargo que ocupem”, defende o deputado. Para ser protocolado na Casa, o documento precisaria conter 171 assinaturas de deputados e lideranças, no entanto, foram coletadas por Maldaner quase 200 assinaturas.

A proposta de Maldaner extingue o foro especial por prerrogativa de função, nas infrações penais comuns, para o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Senadores, os Deputados, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União, os chefes de missão diplomática de caráter permanente, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, os Prefeitos, os Desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, os juízes estaduais, os juízes federais, incluídos os juízes da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, os membros do Ministério Público estadual e os do Ministério Público da União.

Críticas ao projeto do MPF 

Durante a audiência pública desta terça-feira (23), os advogados e especialistas também criticaram alguns pontos das 10 medidas apresentadas pelo Ministério Público Federal – como as restrições ao habeas corpus e a permissão de uso de provas ilícitas, em alguns casos. Para os participantes da audiência, as medidas comprometem garantias individuais previstas na Constituição. Segundo o juiz Marcelo Semer, o projeto tem viés acusatório e fere o ordenamento jurídico brasileiro em diversos pontos.

Ele criticou a possibilidade de prisão preventiva sem o devido fundamento, o aumento de penas sem levar em consideração a proporcionalidade das punições para outros crimes e a definição das penas de acordo com o tamanho do prejuízo. Para Semer, a proposta “se adequa ao velho lema de que os fins justificam os meios”. Ele criticou também limites aos recursos dos réus e à concessão de habeas corpus.

Outro convidado, o sociólogo Alberto Carlos de Almeida, autor do livro “A Cabeça do Brasileiro”, disse que o projeto não atinge as causas da corrupção. “O projeto não ataca a fonte: o processo eleitoral. Enxuga o gelo em vez de impedir que ele derreta. Se a gente não atacar a fonte, que é o problema da legitimidade do sistema político, não vai adiantar nada”, disse.

Almeida elogiou a iniciativa de discutir o combate à corrupção, mas destacou a necessidade de aperfeiçoar o sistema eleitoral, de maneira a garantir legitimidade à representação popular.