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SERVIDOR PODE FICAR SEM SALÁRIO

No exato momento em que você lê esse artigo, em cerca de 576 cidades, os prefeitos não têm conseguido pagar em dia o salário dos seus servidores, e o que mais assusta e que dentro desse número 11% estão com atraso superior a seis meses, segundo levantamento efetuado pala Confederação Nacional dos Municípios.
No Brasil temos cerca de 5.570 cidades, certamente você deve achar um absurdo, afinal cada município criado exige toda uma estrutura de executivo e legislativo, que muito pouco ou quase nada melhoram a vida dos cidadãos, é bom lembrar que desses, mais de 1300 foram criados após a Constituição de 1988.
A maioria absoluta das cidades dependem do repasse do Fundo Nacional dos Municípios, logo precisam do repasse da União e também do Estado. Para se ter uma ideia, apenas 100 cidades no Brasil inteiro, conseguem pagar o quadro de funcionários com receita própria. Nesse momento, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), até abril, 22,5% das prefeituras do País ultrapassaram o limite da lei de Responsabilidade Fiscal com a folha de pagamento, o que nos permite ter um primeiro diagnóstico. Milhares de servidores não estão contentes com o que recebem, e cada vez vai ficar mais difícil eles receberem.

A Republica Federativa do Brasil é formada:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
Esses são os valores protegidos pela Magna Carta, mas como garantir o exercício da Cidadania sem investimento e sem a prestação do serviço com qualidade? Como proteger a dignidade humana que se perde nas filas incontáveis do serviço público e desaparece na arma do bandido que nos assalta? Como fomentar os valores sociais do trabalho quando o Estado (União, Estados e Municípios) perderam a capacidade de intervir na economia?
Mais do que uma crise econômica, vive-se uam crise institucional com o esgotamento do papel do Serviço Público, que cada vez serve menos ao público. A crise econômica, que ainda deve perdurar por todo ano de 2016 e 2017, acentua esse quadro, pois pelo menos R$ 165 bilhões deixaram de entrar nos cofres dos Municípios nos últimos anos, por outras razões que acabaram agravando esse quadro, como por exemplo os cerca de R$ 122,7 bilhões, fruto de desonerações do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Renda (IR), que por consequência diminuíram as transferências do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), uma das principais fontes de receitas das prefeituras, isso apenas entre 2008 a 2014.

Além desses valores, ficaram ainda os chamados restos a pagar, valores empenhados (compromisso de que há crédito para a obra) que não receberam desembolso do Tesouro Nacional e foram transferidos para o ano seguinte. De 2003 para cá o governo deixou de pagar aos municípios R$ 43 bilhões. No total, são 80 mil empenhos referentes a obras iniciadas e emendas parlamentares. Um reflexo dessa interrupção é a paralisação generalizada de obras Brasil afora, o que bem pode ser mensurado pelas mais de 270 empreiteiras que pediram recuperação judicial somente no ano de 2015.

A ausência do Estado (União, Estados e Municípios) representa um custo maior no bolso dos contribuintes brasileiros, com a não entrega dos serviços públicos. Para acentuar essa situação, a crise e o desemprego aumento o número de usuários dos serviços públicos, pois muitos deixaram seus convênios particulares e iniciaram o uso do sistema público, somente nesse ano mais de 60 mil pessoas deixaram os convênios médicos privados e foram para rede pública.

É evidente que a atual crise, serviu apenas como catalizador desse assustador quadro, onde a automatização das rotinas não representou, para esse segmento a redução nos quadros de servidores, muito pelo contrário os órgãos ficaram ainda mais inchados. Só nas prefeituras são cerca de 6,3 milhões de servidores.
Como consequência disso, ao longo desse mesmo período a dívida previdenciária dos Municípios, cresceu 181% de 2009 para cá e alcançou a cifra de R$ 100 bilhões, e por estarem inadimplentes essas cidades acabam não recebendo a transferência de recursos federais. Nesse momento no Brasil, cerca de 995 delas tiveram as verbas do Fundo de Participação dos Municípios zeradas por causa do atraso no pagamento da dívida
A inadimplência afeta não só os funcionários, mas também os fornecedores das prefeituras, nesse momento cerca de 59,2% dos municípios estão com algum atraso no pagamento de fornecedores. Desses, 8,6% estão com atraso superior a seis meses. Outras prefeituras vão além e comprometem os serviços públicos básicos.

Enfraquecido por uma queda nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), o caixa das Prefeituras terá de arcar este ano com R$ 9,41 bilhões em despesas relativas a reajustes obrigatórios na folha de pagamento. A estimativa da Confederação Nacional de Municípios (CNM) é de que o aumento de 11,68% no salário mínimo gere um impacto financeiro de R$ 2,62 bilhões na esfera municipal, enquanto o reajuste do piso do magistério deve custar R$ 6,78 bilhões. A situação vem se agravando nos últimos anos, por causa da expansão dos gastos com pessoal num ritmo superior ao do crescimento da receita.
Desde 2010, o piso dos profissionais de educação subiu 108% em termos nominais. Já o incremento na arrecadação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) foi de 59%, no período. Só no ano passado o piso foi reajustado em 13,01%, quase três vezes mais que o percentual de expansão do Fundeb (4,5%).

Pelos cálculos da CNM, mais de mil municípios, do total de 5.568 existentes no país, já gastam 100% do Fundeb com pagamento de pessoal e, portanto, precisam remanejar recursos de outras áreas para custear outras despesas, como merenda e transporte dos alunos. São inúmeros direitos criados sem fonte para pagamento.
Em média, as prefeituras já investem em educação um percentual acima daquele previsto na legislação. Nesse instante já estamos em 30%, cinco pontos percentuais acima, do percentual obrigatório. A previsão legal é de pelo menos 25% da receita de impostos e transferências constitucionais sejam gastos anualmente em educação.
A dependência do FPM, que reflete o nosso modelo fiscal, onde as receitas tributárias decorrem dos tributos atrelados ao consumo, faz com que tenhamos um efeito dominó. Primeiro o consumo é afetado, depois a arrecadação de tributos ligados a ele (ICMS, IPI, COFINS, PIS), depois a queda nos repasses da União e dos Estados. Para se ter uma ideia nos primeiros quatro meses do ano a queda nos repasses do FPM, que é a principal fonte de recursos de 81,54% das prefeituras brasileiras, foi 4,1% inferior em termos nominais, o que é bem maior se consideramos a inflação, ao registrado no mesmo período de 2015. A escassez de recursos tende a continuar no curto prazo.

O Princípio da Eficiência, previsto no artigo 37, e que rege a Administração Pública, deve ser mensurado na qualidade dos serviços públicos prestados por ela, logo reduzir a máquina e recuperar a capacidade de investimento será a chave para os homens públicos com projeto de Estado, ainda que estes estejam em falta.
As parcerias, independentemente do modelo adotado, seja PPPs ou concessões, devem ganhar velocidade, em resposta ao movimento paquidérmico Estatal, que muito cobra do cidadão e pouco lhe devolve.
Ao mesmo tempo é bom lembrar que nenhuma reforma previdenciária produzira resultado no curto prazo, algumas medidas são emergentes e independem da reforma, algumas devem ser feitas sem grande debate:
1) Aumento da idade máxima para aposentadoria para 75 anos, isso permitiria que muitos servidores que gozam de plena saúde continuem a exercer seu trabalho, sem a necessidade do pagamento de uma aposentadoria, mais o valor para quem ocupar a vaga do aposentado;
2) Criação de gratificação não incorporável, de até 20% sobre o vencimento para o servidor que já tenha tempo de serviço e resolva continuar trabalhando ainda, isso representa como no caso acima uma economia significativa, pois cada servidor aposentado requer um novo para função dele;
3) Redução dos cargos comissionados, e substituição deles por servidores do quadro, remunerados com função gratificada não incorporável;
Sem uma intervenção imediata, o serviço público municipal caminha a passos largos para inadimplência no salário dos seus servidores.
Alterara a Lei de Responsabilidade Fiscal, será o mesmo que tapar o sol com a peneira, ou o Serviço Público se reinventa ou pode morrer de inanição, e o servidor sem ver a cor do seu salário.

 

Charles M. Machado

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