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TCE confirma prejuízos de R$ 3,4 milhões por institutos municipais de Previdência

O Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE/SC) está analisando operações de compra e venda de títulos públicos federais em valores incompatíveis com os praticados no mercado financeiro, realizadas por institutos de previdência de municípios catarinenses (Saiba mais). Os processos são referentes a procedimentos feitos pelas autarquias de São Bento do Sul, Jaraguá do Sul, Camboriú, São José, Itajaí, Balneário Camboriú e Palhoça, nos anos de 2005 a 2008, e as possíveis irregularidades podem ultrapassar os R$ 48 milhões.

De acordo com a Diretoria de Contas de Gestão (DGE) do TCE/SC, todos os processos foram convertidos em tomada de contas especial, para permitir a apresentação de defesa pelos responsáveis acerca de supostas ilegalidades ensejadoras de imputação de débito. Caso seja confirmada a ocorrência de dano ao erário, o Pleno determinará a devolução dos recursos aos cofres dos municípios prejudicados, que poderão dobrar o valor inicial já que deverão ser atualizados a partir dos fatos geradores.

Recentemente, o Tribunal determinou que ex-diretores do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Camboriú (CamboriúPrev) e a empresa Somma Investimentos S.A. recolhessem aos cofres municipais R$ 129.094,62, referentes à perda de rentabilidade ocorrida na venda de 1.508 títulos públicos, que custaram, em 1º de junho de 2007, R$ 2.374.087,89. Calculado até outubro de 2019, o valor da devolução passará dos R$ 320 mil, conforme informação da Secretaria-Geral do TCE/SC.

A operação pelo preço unitário (PU) de R$ 1.574,32884200 foi inicialmente analisada pela então Diretoria de Controle dos Municípios (DMU) da Corte catarinense. Segundo a DMU, a venda foi feita por 5,157% a menos que o PU dos títulos públicos praticado no mercado, com base no valor de referência encontrado e de 6,9% inferior ao divulgado pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima).

Embora a venda tenha sido efetivada pela agente de mercado Coluna Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S/A, a empresa Somma prestou assessoria financeira e sugeriu o PU de R$ 1.571,877007 por títulos, com base em avaliação feita em 14 de maio de 2007. Mas a área técnica observou que o preço praticado naquele dia, pela Anbima, era de R$ 1.655,34990104.

Com base no relatório da área técnica, o relator do processo (@TCE 14/00637659), conselheiro Luiz Roberto Herbst, destacou que o ato configurou “operação lesiva ao patrimônio financeiro do Instituto Previdenciário”. Ressaltou ainda que o procedimento contrariou o disposto no art. 1º da Resolução n. 3.244/2004, do Conselho Monetário Nacional (CMN) — que obrigava o cumprimento de requisitos, como segurança, rentabilidade, solvência e liquidez —, bem como o princípio da eficiência previsto na Constituição Federal.

As investigações são decorrentes de representações formuladas pelo Banco Central do Brasil (Bacen), autarquia federal responsável pela fiscalização, o monitoramento e a punição por eventuais descumprimentos das normas expedidas pelo CMN.

Tais regras tratam dos investimentos no mercado financeiro para a consecução dos objetivos financeiros e atuarias dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPSs) dos municípios, de modo que seja alcançada a rentabilidade necessária para os pagamentos dos benefícios futuros.

Responsabilizações

A decisão 494/2019, aprovada na sessão do Pleno de 23 de setembro, imputou o débito de R$ 129.094,62, solidariamente, à presidente e ao diretor financeiro do CamboriúPrev em 2007, Dionete Cesário Albino e Nilto Assis Coppi Junior, respectivamente, e à pessoa jurídica da empresa Somma Investimentos S.A.

Em seu relatório, o conselheiro Herbst afirmou que a responsabilidade da empresa Somma ficou evidenciada quando produziu parecer estipulando um preço em “descompasso” dos atribuídos pelo mercado, sem indicação das bases utilizadas para a sua projeção, “contribuindo, sobremaneira, para a tomada de decisão e a realização da operação pelos gestores públicos”.

O relator salientou, no entanto, que os gestores — presidente e diretor financeiro à época — “deveriam ter se cercado de maiores cuidados”, principalmente no sentido de questionar a empresa de consultoria quanto à ausência de fonte de informação no parecer elaborado. Ele acrescentou que deveriam ter tido a preocupação de pesquisar no mercado o valor real, para a obtenção do melhor preço, “a fim de garantir condições de segurança, rentabilidade, solvência e solidez aos escassos recursos financeiros do Instituto”.

A responsabilidade da empresa Coluna Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S/A foi afastada, pois a área técnica do Tribunal de Contas entendeu que a decisão de venda não era da empresa intermediária e, sim, do próprio Instituto de Previdência.

Os responsáveis terão 30 dias — a partir da publicação da decisão no Diário Oficial Eletrônico do TCE/SC prevista para ocorrer até o fim deste mês de outubro — para recolher o valor atualizado aos cofres do município ou para interporem recurso.

A decisão ainda recomendou à Diretoria Executiva e ao Conselho Deliberativo do CamboriúPrev que atentem para a necessária qualificação profissional dos responsáveis pela gestão de ativos e mantenham adequação às melhores práticas de investimentos dos recursos do regime próprio, observada a austeridade, transparência e a segurança nas aplicações.

Outros processos

A compra de títulos públicos federais pelo Instituto de Previdência dos Servidores Públicos de São Bento do Sul (IPRESBS) e pelo Instituto de Seguridade dos Servidores Municipais de Jaraguá do Sul (Issem) também foi considerada irregular pelo Tribunal de Contas. Em decisões aprovadas em agosto de 2018 e junho deste ano, respectivamente, o Pleno condenou os responsáveis pelo ressarcimento ao erário dos valores pagos a maior.

No processo (TCE 06/00466787), que trata de operações realizadas pela autarquia de Jaraguá do Sul, a Corte catarinense determinou a devolução de R$ 2.445.005,54 — atualizado até outubro o valor está em R$ 6.487.996,54 — aos cofres do município, recursos decorrentes do sobrepreço na compra de 12.560 títulos públicos federais, nos anos de 2005 e 2006.

Em 11 de novembro de 2005, o Issem adquiriu 5.947 títulos, por um preço de R$ 1.345,18126820 a unidade, 21,96% acima do PU praticado no mercado de R$ 1.102,907989. Ao todo, foi feito um desembolso de R$ 7.999.793,00, sendo R$ 1.440.799,19 a maior.

E em 17 de março de 2006, foram feitas duas operações: uma para a compra de 6.206 títulos e outra para a de 407 títulos, ambas pelo preço de 1.512,10 a unidade, 11,16% acima do PU encontrado de R$ 1.360,2473. Dos pagamentos de R$ 9.384.096,77 e R$ 615.424,97, foram pagos a mais R$ 1.004.206,35.

Ao relatar o processo, a conselheira substituta Sabrina Nunes Iocken enfatizou a necessidade de realização de pesquisa de preços para a compra e venda de títulos, com a finalidade de parametrização, já que existe alta competitividade entre as operadoras. “Configura-se inafastável o dever de diligência […], devendo o responsável pela aplicação munir-se de informações […], com o fito de realizar a negociação de títulos de forma segura”, apontou.

Para a relatora, “ocorreu uma grave inobservância de um dever de cuidado por parte dos gestores do Issem”. Na sua opinião, qualquer pessoa apta a assumir um cargo de presidente e de superintendente de um instituto de seguridade, teria ou deveria ter a iniciativa de ao menos conhecer os termos do negócio jurídico que assinou, em especial as obrigações relativas à aplicação dos recursos do regime próprio em títulos e valores mobiliários.

Foram responsabilizados pela perda de rentabilidade os ex-presidentes do Instituto, Walter Batista Falcone e Nicácio Gonçalves, e a empresa Euro DTVM Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários, nas pessoas de Jaime Nader Canha, administrador da Massa falida, e Jorge Luiz Gomes Chrispim, João Luiz Ferreira Carneiro e Sérgio de Moura Soeiro, sócios-administradores à época. Um recurso (REC 19/00834259) contra a decisão 302/2019 está tramitando no TCE/SC.

No processo (TCE 08/00432916) relatado pelo conselheiro César Filomeno Fontes e que trata de operações realizadas pela autarquia de São Bento do Sul, o Tribunal determinou a devolução de R$ 869.209,49 — atualizado até outubro o valor está em R$ 2.246.261,35 — aos cofres do município, recursos decorrentes do sobrepreço na compra de 7.450 títulos públicos federais, em 2005 e 2006.

Do total dos títulos, 1.550 foram adquiridos em 21 de dezembro de 2005 pelo preço unitário de R$ 1.609,03148000, 9,23% superior ao PU praticado no mercado, com base no valor de referência encontrado de R$ 1.472,998847. Segundo a área técnica, houve um desencaixe de R$ 210.850,58 dos cofres do IPRESBS.

“Um dano que, na verdade, poderia ter sido evitado se o gestor tomasse o mínimo cuidado de verificar os preços negociados nos dias anteriores, por exemplo”, afirmaram os auditores fiscais de controle externo do TCE/SC, no relatório.

Tal situação voltou a ocorrer em 19 de outubro de 2006, quando foram comprados 5.900 títulos. Na época, cada um custou R$ 1.421,77860000, 8,51% a mais que o PU encontrado de R$ 1.310,192345, provocando um pagamento a maior de R$ 658.358,91.

Pela operação realizada em 2005, foram responsabilizados os presidente e diretor financeiro, Flávio Antônio Pinho da Silveira e Aloysio dos Santos Bahiense Júnior, respectivamente. Este último, que exerceu o cargo de presidente em 2006, e o ex-diretor financeiro Paulo Roberto Scheide, também foram condenados a devolverem os valores aos cofres do município. Contra a decisão 422/2018, foi interposto recurso (REC 18/01154993).

De acordo com a área técnica, para calcular o prejuízo aos institutos de previdência, foram adotadas a taxas máxima (no caso de venda) e mínima (no caso de compra) de negociação do intervalo indicativo, avaliada pela Anbima, aplicada à fórmula do Tesouro Nacional para definição dos preços dos títulos públicos federais.

A intenção, conforme afirmado pelos auditores fiscais no relatório do processo de Camboriú, é buscar o preço mais conservador. “Essa maior taxa de negociação, aplicada devidamente na referida fórmula [verificada no processo do CamboriúPrev], implicará num valor menor de referência para a venda, possibilitando um alargamento da margem do gestor no trato com as operações”, explicaram.

Saiba mais 1: Relação dos processos de irregularidades nos Institutos de Previdência Municipais

Nº Processo

Unidade Gestora

Estágio Processual

Valor Débito

08/00432916

Instituto de Previdência dos Servidores Públicos de São Bento do Sul (IPRESBS)

Julgado

 

Com recurso

869.209,49

Atualizado até 10/19

2.246.261,35 *

06/00466787

Instituto de Seguridade dos Servidores Municipais de Jaraguá do Sul (ISSEM)

Julgado

 

Com recurso

2.445.005,54

Atualizado até 10/19

6.487.996,54 *

14/00637659

Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Camboriú (CamboriúPrev)

Julgado

129.094,62

Atualizado até 10/19 – 320.154,66 *

09/00075651

Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de São José (SJPrev)

Aguardando análise das manifestações

33.632.934,84

15/00125439

Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de São José (SJPrev)

Aguardando análise das manifestações

2.539.072,58

09/00075732

Instituto de Previdência de Itajaí (IPI)

Aguardando análise das manifestações

2.884.191,88

14/00379692

Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Balneário Camboriú (BCPrevi)

Aguardando análise das manifestações

3.458.294,48

14/00637810

Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos de Município de Palhoça (IPPA)

Aguardando análise das manifestações

2.628.944,36

14/00638205

Instituto de Seguridade dos Servidores Municipais de Jaraguá do Sul (ISSEM)

Aguardando análise das manifestações

247.574,96

Total

48.834.322,75

Fonte: Diretoria de Contas de Gestão (DGE).

Saiba mais 2: Títulos públicos federais

São papéis emitidos pelo Tesouro Nacional como forma de captar recursos para financiar atividades do governo federal, tais como educação, saúde e infraestrutura. Ou seja, são instrumentos financeiros emitidos pelo Governo federal, na forma da lei, para obtenção de recursos junto à sociedade, com o objetivo primordial de financiar suas despesas

Fonte: Relatório técnico do processo REP 08/00432916.

Saiba mais 3: A Anbima

É uma entidade civil, sem fins lucrativos, credenciada pelo Banco Central e maior provedor estatístico do mercado financeiro do Brasil, congregando a maioria das instituições financeiras que operam na Bolsa de Valores, cujos indicativos servem de parâmetro aos operadores do mercado de capital. O próprio Banco Central utiliza os dados por ela divulgados, como comparativo.

Por isso, que os preços calculados pela Anbima servem de referência para o mercado financeiro, não por imposição legal, mas em razão de que o próprio mercado pauta seus negócios com base nessas informações, em função da confiança nos critérios científicos utilizados pela Instituição.

Fonte: Relatório do relator do processo (@TCE 14/00637659) que trata do CamboriúPrev, conselheiro Luiz Roberto Herbst.

Saiba mais 4: As operações de compra e venda de títulos públicos federais

Servem para que os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPSs) consigam atingir os objetivos financeiros e atuariais e, consequentemente, alcancem a rentabilidade necessária para os pagamentos dos benefícios futuros.

Estes investimentos no mercado financeiro obedecem aos limites de alocação estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), a fim de melhorar a distribuição de recursos nos mais diversos segmentos de aplicação, sem, no entanto, deixar de otimizar a rentabilidade do regime.

No segmento de renda fixa, os recursos dos RPPSs devem ser aplicados em títulos de emissão do Tesouro Nacional.

As operações realizadas pelos RPPSs ocorrem no mercado secundário de títulos públicos, o que proporciona maior visibilidade às taxas negociadas e garante diferenças mais justas entre os preços de compra e venda.

Por meio de corretoras ou distribuidoras, consideradas entidades não bancárias, os regimes adquirem os papéis e os mantém em suas carteiras ou se desfazem, dependendo dos objetivos do gestor.

Exatamente nestes momentos, de compra ou venda de um papel, é que o gestor de um RPPS deve concentrar seus esforços e reunir conhecimento e informação para obtenção do melhor preço no tocante à busca da melhor rentabilidade, seja para compra, seja para venda.

Na Contabilidade dos RPPSs, esses novos investimentos recebem apenas tratamento financeiro, e, por isso, não constarão da proposta orçamentária. Trata-se de um registro contábil de troca de ativos financeiros. Os recursos auferidos com a carteira de investimentos são destinados a garantir a manutenção do regime, podendo ser transferidos para as atividades previdenciárias (pagamento de benefícios) a qualquer momento, independentemente do seu vencimento ou do prazo do investimento.

Normas do CMN estabelecem que a carteira de ativos dos RPPSs deve ser aplicada tendo presentes as condições de segurança, rentabilidade, solvência, liquidez e transparência, atributos dos investimentos necessários a preservar o equilíbrio atuarial do regime.

Fonte: Relatório técnico do processo REP 08/00432916.